terça-feira, 30 de janeiro de 2018

No vácuo dos silêncios.



Tenho a vida suspensa num varal
Anoiteço todo dia com a lua e com você
Todo dia de manhã o sol vem me acordar
Antes de abrir os olhos,
Eu  acordo com você.
Mas é só no pensamento.
É o ritual da distância,
É a rotina da ausência,
Da presença mais presente,
 na impossibilidade real.

Tenho a vida suspensa no sonho.
Todo dia não consigo me livrar
da vontade de ter você por perto.
E então eu me envolvo em pensamento,
Em vestígios, em lembranças,
Em passados...
Que me impedem de seguir outro caminho.

Tenho a vida suspensa na ilusão
De que um dia tudo vai se resolver.
Mas não vai. Será sempre o mesmo abismo
de ansiedades,
de abandonos,
sem destino,
de caminhos solitários, trilhados na multidão.
Vera Lúcia

30/01/2018

sábado, 27 de janeiro de 2018

No Caminho com Maiakóvski



Assim como a criança
humildemente afaga
a imagem do herói,
assim me aproximo de ti, Maiakóvski.
Não importa o que me possa acontecer
por andar ombro a ombro
com um poeta soviético.
Lendo teus versos,
aprendi a ter coragem.
Tu sabes,
conheces melhor do que eu
a velha história.

Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor
do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem:
pisam as flores,
matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia,
o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz, e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.
Nos dias que correm
a ninguém é dado
repousar a cabeça
alheia ao terror.
Os humildes baixam a cerviz;
e nós, que não temos pacto algum
com os senhores do mundo,
por temor nos calamos.
No silêncio de meu quarto
a ousadia me afogueia as faces
e eu fantasio um levante;
mas amanhã,
diante do juiz,
talvez meus lábios
calem a verdade
como um foco de germes
capaz de me destruir.
Olho ao redor
e o que vejo
e acabo por repetir
são mentiras.
Mal sabe a criança dizer mãe
e a propaganda lhe destrói a consciência.
A mim, quase me arrastam
pela gola do paletó
à porta do templo
e me pedem que aguarde
até que a Democracia
se digne a aparecer no balcão.
Mas eu sei,
porque não estou amedrontado
a ponto de cegar, que ela tem uma espada
a lhe espetar as costelas
e o riso que nos mostra
é uma tênue cortina
lançada sobre os arsenais.
Vamos ao campo
e não os vemos ao nosso lado,
no plantio.
Mas ao tempo da colheita
lá estão
e acabam por nos roubar
até o último grão de trigo.
Dizem-nos que de nós emana o poder
mas sempre o temos contra nós.
Dizem-nos que é preciso
defender nossos lares
mas se nos rebelamos contra a opressão
é sobre nós que marcham os soldados.
E por temor eu me calo,
por temor aceito a condição
de falso democrata
e rotulo meus gestos
com a palavra liberdade,
procurando, num sorriso,
esconder minha dor
diante de meus superiores.
Mas dentro de mim,
com a potência de um milhão de vozes,
o coração grita – MENTIRA!
 (Eduardo Alves da Costa)

(Eduardo Alves da Costa) – Não é de Maiakóvski como se espalha por aí como falsa autoria - principalmente um trecho da segunda estrofe.
(Eduardo Alves da Costa, em “No Caminho com Maiakóvski” [poesia reunida]. São Paulo: Geração editorial, 1ª ed., 2003. págs. 47,48 e 49.)
Fontes: Antônio MirandaJornal de Poesia e referência bibliográfica do livro do autor, graças à colaboração de Elfi Kurten Fenske, criadora do Templo Cultural Delfos.
Não há quem não conheça os 15 versos mais do que famosos:
“Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor
do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem:
pisam as flores,
matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia,
o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz, e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.”
Eles fazem parte, desde 1968, quando foram escritos, de um longo poema do brasileiro Eduardo Alves da Costa, que nasceu em Niterói e vive desde a infância em São Paulo. Por algum motivo, foram logo atribuídos pelo escritor Roberto Freire, na epígrafe de um de seus livros, ao poeta russo Wladimir Maiakovski. O equívoco foi corrigido, mas a falsa autoria pegou: os versos foram transformados em pôster pelos líderes estudantis que combateram a ditadura militar, nos anos 70; transformados em inscrição da camiseta amarela da campanha pelas Diretas Já, nos anos 80: e, traduzidos para vários idiomas, transformados em corrente na Internet, nos anos 90. Aí, o autor já não era nem Eduardo nem Maiakóvski, mas Gabriel García Márquez, Bertolt Brecht, Wilhelm Reich e Leopold Senghor, entre outros.
Eduardo, poeta e artista plástico que já expôs na França na Alemanha, viu o poema impresso – e atribuído a Maiakóvski – na parede de uma galeria de arte em Paris e num café em Praga, na Tchecoslováquia

O poeta pede ao seu amor que lhe escreva



Amor de minhas entranhas, morte viva,
em vão espero tua palavra escrita
e penso, com a flor que se murcha,
que se vivo sem mim quero perder-te.
O ar é imortal. A pedra inerte
nem conhece a sombra nem a evita.
Coração interior não necessita
o mel gelado que a lua verte.
Porém eu te sofri. Rasguei-me as veias,
tigre e pomba, sobre tua cintura
em duelo de kordiscos e açucenas.
Enche, pois, de palavras minha loucura
ou deixa-me viver em minha serena
noite da alma para sempre escura.


Vladimir Maiakovski

segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Eu me anoiteço no além






Eu me anoiteço no além E dou-me ao dia, se convém. Porém, A escuridão não me apavora, Tampouco o brilho da aurora. Embora O pesadelo que me habita Torne minh'alma tão contrita! (César Fontana)


Gostei, postei!!!

terça-feira, 16 de janeiro de 2018

Do livro de histórias da vida...




Às páginas tantas do livro de histórias da vida,
Duas almas gêmeas coincidiram seus capítulos...
E acharam-se de se encantar...
Ele trazia de longas jornadas longas histórias...
Ela trazia longas histórias de longas jornadas...
Que eram de cada um.
E que não eram suas.
Mas o que importa? Encontraram-se!

Era a chegada de tantas partidas...
E coincidiram!
No gesto, no traço e no olhar...
E uma história terceira, intrusa, interdita,
passou a ser escrita.
Numa escrita ágrafa e agramatical.
Sem contornos, sem domínios e sem leis.
Só sentimentos!
Mas também sem volta!

E no livro de histórias da vida os capítulos progrediram...
Atropelados...
Ora corridos... ora  perdidos no tempo.
E, em lapsos de felicidade,
Nos retalhos de paraíso,
a vida a pulsar plenamente.
Porque “... a terra atrasa e os sons diminuem”
quando seus universos se cruzam.
E então se ouve a eternidade insinuando-se pelas veias.

Peripécias, conflitos e tramas... Com dramas!
Ciúmes. Quem disse que o ciúme é mortal?
Às vezes, paralisante. Mas não mata. Só machuca.
E provoca dissabores.
Distâncias, tristezas
saudades, regressos
saídas, silêncios...
Desistência, insistência...
Desencontros, reencontros.
Ansiedades. Uma alma busca a outra sem tréguas.
Intervalos, hiatos.
Os caminhos às vezes se alargam...
cada um fica de um lado da estrada
que não se atravessa.
Dores silenciosas habitam seus dias.

E os capítulos se acumulam.
Não há retornos
porque os caminhos já se cruzaram
as veredas se estreitaram,
em trilhas se entrelaçaram
e  isso  fechou o ciclo.
Se esta vida deu a chance,
é porque deveriam se encontrar.
No livro dos recomeços muitas páginas se contam.
Com a mesma ladainha,
Com a mesma sinfonia,
Com os mesmos recortados
entrecortes de suspiros e silêncios.

Quem disse que almas gêmeas são gêmeas de harmonias?
Às vezes se desgovernam em descaminhos pequenos,
Em arrufos amuados,
Por conta de coisa pouca,
multiplicam dissabores.
Mas vivem afinidades sobre gostos e interesses.
E segredos...
E paixão...
Deslumbramentos...
Admiração...
(admiram-se mutuamente).

Aquele sexto sentido
Que avisa da grande falta,
Que avisa da grande ausência,
Que promove os reencontros,
Nem que seja em pensamentos;
Aquela presença ausente
Que faz transbordar vazios
De todas as horas do dia,
De todo tempo da noite
Acordados ou em sonhos...
Não dorme, está sempre alerta!

Na jornada se confundem
Cartinhas de muito amor,
Poemas de tanto querer,
Mensagens em guardanapos,
Avisos subliminares,
Códigos de textos cifrados,
Textos em códigos secretos...
Sorrisos de coisas mínimas,
Doçuras de encontros loucos,
Loucuras de encontros tortos
Na surpresa da espera.

Outras vezes se escondem
Sentimentos mal sentidos,
Conversas entrecortadas,
Transgressões não transgredidas
e desesperos de sonhos.
Arroubos de ansiedades pela falta da presença,
Criancices de adultos que inventam de se apaixonar.
Mas não há cerca e reserva,
Se o caminho é de almas gêmeas...

E o livro de histórias da vida
vai cumprindo o seu destino.
Anotando em cada página
Sucessos e insucessos
De mais esta caminhada
Nas veredas da eternidade
De duas almas confusas,
Que se buscam e se perdem
Mas sem nunca desistir.

Os dias transcorrem turvos,
Em novelos enovelados...
Cada um por sua parte,
Procura normalizar
O que nunca foi normal.
Está visto, não conseguem!
E as torrentes extrapolam
Os diques bem construídos,
Arrebentam corredeiras,
Sem rumor e sem alarde.

Um dia, de tanto sentir,
Um dia, de tanto guardar,
Um dia, de tanto amor,
Um dia, de tanto esperar,
Levantarão as amarras,
E, num voo libertador,
Deixarão tudo pra trás...
Tudo que não for de si.
E contarão um com o outro,
E contarão um pro outro,
Pelas contas do rosário
Que desfia suas sinas,
A história de amor sem fim
Escrita no livro da vida,
Escrita no livro de histórias
que se contam dos destinos
de cada alma contada,
de cada alma encontrada,
de cada alma perdida,
que passou além da vida,
para encontrar sua outra
indiscutível metade.
Que sem ela nada vale,
Nem terços, nem ladainha,
Nem reza, nem penitência...

Muito além de tudo isso,
Só conta a natureza,
a forma e o conteúdo,
de um que se acomoda
na natureza do outro,
como um vaso que recebe
a essência que o completa;
até que de tanto ser,
até que de muito sentir,
até que  na perfeição
tudo isso se confunda
e o mistério a se fundir
numa única verdade
de duas almas distintas
moldando-se eternamente
numa única certeza
de terem, por todo o sempre,
sido dois pedaços soltos,
à procura do encontro
que em momento supremo,
no gesto mais ancestral
da busca da unidade,
juntam-se esses dois pedaços,
numa natureza só,
totalmente indivisível.

E na pauta do destino,
E no último capítulo,
Fecha-se o livro de histórias
Que conta as histórias da vida,
De duas almas unidas,
No selo de além do tempo,
Para a última viagem
Do traçado indelével,
Escrito antes de ser,
No retorno ao princípio,
Da pura forma de origem
Co’a última linha do epílogo,
Do livro de histórias da vida.

Vera Lúcia
(15/01/2018)

quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

Não se faz um soneto




Não se faz um soneto, ele somente
Está à espera que se lhe abra a porta.
E quando nossa alma assim consente,
Ele irrompe, feliz, da cinza morta.

Estava tão quieto, tão silente
Que nem o tudo nem o nada importa.
Só ele que, deveras, de repente,
No seu surgir, a todos nos conforta.

Ah! soneto magia das palavras
Que surge de si mesmo, enquanto lavras
Pensamentos sutis e tão fugazes...

Ah! soneto resumo da beleza
Do verso puro...de tanta pureza
De que jamais seremos nós capazes.

Getúlio Targino
Campo Grande ( MS ) em 26/11/12

Achei legal!!!

Encontro






Incitados pela brisa
O rio,
A tarde
E a ponte
Se encontram.
E felizes e encantados
Extasiam-se
Ante teu sorriso
Que ilumina o sol,
Em tarde
De quase
Primavera!

(Crônica e Seresta)

quarta-feira, 10 de janeiro de 2018

Mar Português




Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!

Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma nao é pequena.
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.

                    (Fernando Pessoa, in Mensagem)


Muitos querendo passar o Bojador,
Poucos com coragem de ir além da dor!

Só para eu não me esquecer!

terça-feira, 9 de janeiro de 2018

Você/ Dulcineia del Toboso



Você/ Dulcineia del Toboso

Você é como o vento, que passa e me abraça e beija.
Você é como o sol que me aquece e a lua que me acalanta.
Você é como a chuva que lava as minhas tristezas.
Você é a força que me devolveu à vida.
Você é tudo, o meu tudo.

(Cavaleiro Andante/ Dom Quixote de La Mancha)


(06/01/2018)